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Os atos de fé, gratidão e fraternidade na Festa de Santa Luzia

Criada há 101 anos, a Associação Beneficente de Santa Luzia mantém a tradição de uma das mais importantes festas religiosas da Cidade de Goiás, bem como a promoção de ações sociais em benefício da comunidade

 

No mês de dezembro, a Cidade de Goiás vive um momento especial de devoção, gratidão, tradição e fé, durante a realização da Festa de Santa Luzia.

E é na sede da entidade que comanda a festa que quase tudo acontece, num belo casarão da Rua D’Abadia, caracterizado por uma grande pedra incrustrada entre a parede frontal e calçada. O casarão é a sede da Associação Beneficente de Santa Luzia da Classe Operária, fundada em 1912.

A festa, em honra à mártir cristã italiana Luzia de Siracusa, morta no contexto das perseguições de Diocleciano aos cristãos, tem início com uma concorrida novena que tem, no seu último dia, a tradicional benção da água de Santa Luzia.

No dia 13 de dezembro, ponto alto da festa, as celebrações começam às seis da manhã, com o Santo Terço em intenção à santa e aos devotos que depois, às nove horas, participam de uma missa festiva na Igreja do Rosário.

Após a missa, tem início a procissão de trasladação da imagem de Santa Luzia até a sede da associação, onde é realizado o santo terço designado aos operários e em proteção contra as enfermidades dos olhos.

Entre os milagres atribuídos à santa, destaca-se a cura de sua mãe, Eutíquia, que sofria de uma grave doença hemorrágica. Segundo a tradição católica, durante uma peregrinação ao túmulo de Santa Águeda, Luzia teve uma visão da santa, que lhe prometeu a cura da mãe. A partir de então, Luzia passou a ser invocada para curar enfermidades dos olhos.

Por esta razão, durante as celebrações da festa na Cidade de Goiás, é comum ver dezenas de fiéis com tampão nos olhos, que ali vão para agradecer curas alcançadas. Outra caraterística na novena de Santa Luzia é ser rezada ainda nos moldes do latim.

A festa é encerrada com o tradicional leilão, no qual a comunidade da cidade traz prendas e ofertas para Santa Luzia. O dinheiro arrecadado é revertido para associação.

O historiador Adriano Alcântara, um dos líderes da Associação Santa Luzia e organizador da festa, lembra que, em anos anteriores, as celebrações eram abrilhantadas pela banda de música do 6º Batalhão da Polícia Militar, que hoje não está mais em atividade.

“Antes, a gente tinha a banda do sexto BPM aqui em Goiás, banda de música, que eles davam todo suporte para a gente, não só na procissão, mas numa retreta que eles faziam na porta da igreja, e na hora do leilão. Infelizmente, não temos mais a banda”, lamenta Alcântara.

Mas nada tira o brilho da festa, a devoção dos fiéis e a expectativa dos devotos de Santa Luzia, que aguardam todos os anos chegar dezembro para celebrar a fé.

 

102 anos de ação social e fraternidade

A Associação Santa Luzia foi fundada em 1912 como uma irmandade de devotos da santa.

Até o fim dos anos 70, a entidade tinha como objetivo prestar auxílio-saúde às pessoas necessitadas. A partir de 1981, a associação passou a esposar uma nova ideia de benefício: fazer o auxílio funerário.

Em 1996, a entidade edificou uma sala funerária onde atualmente é realizada a maioria dos velórios da cidade de Goiás.

 

A sede da Associação Beneficente de Santa Luzia Classe Operária tem uma rica história, escrita em mais de um século, onde, em seus salões e quartos, episódios da história da Cidade de Goiás foram contados.

Em meados do Século 19, ali funcionava a hospedaria que recebeu o naturalista e viajante francês Auguste de Saint-Hilaire, integrante dos primeiros grupos de cientistas, vindos da Europa, para realizar pesquisas e explorações no Brasil Colônia, durante os anos de 1816 e 1822. Uma placa na parede do casarão fala do hóspede ilustre que veio conhecer as capitanias do Brasil. O casarão também já funcionou como sede do Tiro de Guerra e serviu de hospedaria militar.

Em 1909, passou a funcionar ali uma unidade da Escolas de Aprendizes Artífices, unidades pertencentes ao Sistema Federal de Escolas de Aprendizes Artífices, criado pelo presidente Nilo Peçanha, e que seria o embrião dos atuais institutos federais de educação, como o IFG em Goiás.

Segundo a historiadora Cristina Gomides, nas décadas de 40 a 50, após a mudança da capital, desabitado, o casarão esteve prestes a desaparecer, com paredes caídas, telhado danificado e grandes fendas nas paredes, necessitando ser utilizado para não ruir de vez.

Em 1952, a família do desembargador Joaquim Taveira conseguiu que o prédio fosse doado para a Associação Santa Luzia. A doação se deu pelo fato da esposa de Joaquim Taveira, Dona Udin, ter feito uma promessa para Santa Luzia em gratidão pela cura de uma doença nos olhos. Dona Udin se esforçou para que o prédio fosse para sempre a sede da entidade. O documento de doação determina que, enquanto a entidade existir o casarão pertence a ela. Desde então, os dirigentes da Associação Santa Luzia cuidam da sede com esmero.

“Lógico que ao longo desse tempo fomos fazendo algumas transformações necessárias. O piso, que era todo assoalhado, hoje ele é de cimento vermelho; o telhado também foi mudado. Há algumas ações que devem ser feitas para que o prédio fique realmente aos moldes da arquitetura da cidade, mas aquilo que precisa de ser preservado, a gente vai preservando por aqui. A gente nunca faz uma ação aqui sem autorização do IPHAN, que é o instituto que cuida desse tombamento. Temos trabalhado com união, porque o prédio é de todos nós. Temos orgulho deste lugar, porque ele é importante; porque abriga toda uma história de momentos e abriga a sede de uma associação tão importante para a Cidade de Goiás”, observa o presidente  Adriano Alcântara.

 

fotos: Ivana Souza

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