O tratamento de hemodiálise é feito em Goiânia, uma vez que não há nenhum hospital ou clínica que faça o procedimento, embora o município seja um polo de saúde para onde acorrem pessoas de uma vasta região à procura do tratamento
VÂNIO LIMIRO
Todas as segundas, quartas e sextas, a guia de turismo Wanessa Barbosa, 38 anos, se levanta as três horas da madrugada e tem meia hora para se aprontar e aguardar a van que para na porta de sua residência, na Cidade de Goiás, de onde partem para Goiânia. Após três horas de viagem, Wanessa chega a uma clínica em Goiânia onde, por volta de seis e meia senta-se em uma cadeira hospitalar e começa sua sessão de hemodiálise.
Durante quatro horas o sangue de Wanessa é retirado por uma agulha especial através de uma fístula arteriovenosa inserida em seu braço esquerdo e bombeado por uma máquina, o dialisador, filtrando as impurezas encontradas no sangue e devolvendo-o purificado ao corpo.
Por volta de onze e meia da manhã, Wanessa entra de novo na van, passa em um restaurante para almoçar e inicia o percurso de volta para a Cidade de Goiás. Cansada, vai chegar em casa lá pelas duas e meia da tarde.
“A viagem é muito desgastante. Temos que sair no meio da madrugada, correndo riscos nas estradas. Na volta é muito calor e já estamos debilitados por causa da sessão. É tudo muito cansativo. Nos dias de terça, quinta e sábado, o pessoal perde o dia todo, pois saem bem cedo só retornam a noite”, conta Wanessa.
A exaustiva rotina é cumprida cerca de doze vezes por mês por Wanessa e dezenas de pessoas que residem na Cidade de Goiás e têm que realizar o tratamento, uma vez que não há ali nenhum hospital ou clínica que faça o procedimento, embora o município seja um polo de saúde para onde acorrem pessoas de uma vasta região à procura de tratamento.
A instalação do serviço de hemodiálise na Cidade de Goiás acabou virando uma novela que se arrasta por quase sete anos e já deu o que falar.
Em 2017, sensibilizado com o problema, o frei dominicano Marcos Lacerda de Camargo, que presidia da Associação de Saúde São Pedro de Alcântara (Aspag), entidade que administra o Hospital São Pedro, começou uma campanha para a construção de uma clínica de hemodiálise na cidade.
“A saúde deveria ser um dever do Estado, mas como não possuímos, em totalidade, este serviço, estamos contando com a doação da comunidade, não apenas da cidade de Goiás, como toda região para a finalização desta obra”, disse o religioso na época. A princípio, frei Marcos começou a mobilizar fiéis para doarem dinheiro, a fim de conseguirem os R$ 2 milhões necessários para viabilizar a obra. A Associação São Pedro iniciou a construção num terreno próprio na Praça do Capim, do outro lado do Rio.
A clínica teria 30 leitos, com mais 35 de reserva, e teria capacidade para atender a demanda regional. Na época, a situação já era calamitosa; 130 pessoas tinham que fazer hemodiálise enfrentando longas viagens. Além de Goiânia, nove delas faziam o procedimento em Iporá e outras dezenove em Goianésia.
A secretaria da Saúde de Goiás, em parceria com a associação, chegou a realizar uma solenidade para o lançamento da construção da clínica e divulgar ima plataforma, denominada “Mãos que Apoiam”, responsável por arrecadar fundos para a construção da unidade.
Em novembro de 2017, o deputado Karlos Cabral se comprometeu em destinar emenda parlamentar no orçamento de 2018 para a clínica. “Hoje abrimos as portas da Assembleia para que a equipe da ASPAG possa sensibilizar os deputados e funcionários da Casa para aderirem a campanha de construção da clínica de hemodiálise”, reforçou o deputado.
Frei Marcos faleceu em 2019 aos 88 anos e ainda lutava pela construção da clínica, o que não aconteceu. Durante anos a obra avançou, parou, avançou e parou novamente; hoje o local está abandonado e em ruinas.
Já se passaram seis anos e o problema continua. A atual presidente da Aspag, Marlene Velasco, diz que é inviável retomar a construção.
“A Aspag não irá dar continuidade a obra; o local é inadequado, não temos recursos para a conclusão da obra e aquisição de equipamentos. Acredito que a policlínica irá colocar 20 máquinas”, informa Marlene.
Em maio de 2022, foi inaugurada no município a Policlínica Rio Vermelho, o que reascendeu a esperança das pessoas que necessitam do tratamento. Durante a inauguração, foi anunciado que a unidade seria ampliada para oferecer o serviço de hemodiálise, assim como existem nas Policlínicas de Posse e Quirinópolis.
Na época, o Governo Estadual afirmou que o local seria dotado de estrutura ampliada para que as pessoas pudessem não tivessem que se deslocar para outras regiões.
O serviço de hemodiálise ainda não está disponível na Policlínica. A reportagem do Jornal Nova Fogaréu entrou em contato, por email, com a secretaria estadual de Saúde para saber sobre a previsão, mas até o fechamento da edição não obteve retorno.
Enquanto isso, o drama de Wanessa Barbosa e outros pacientes continua.
“Faço hemodiálise há 3 anos e 6 meses, mas outras pessoas aqui de Goiás estão há mais de dez anos nessa rotina desgastante. Não sabemos quando poderemos nos tratar aqui, cada vez é uma conversa que sai; a última é que vai abrir na Policlínica, mas a verdade não sabemos. O jeito é enfrentar as viagens semanais a Goiânia” resigna-se Wanessa.
Frei Marcos Lacerda: luta incansável pela construção da clínica de hemodiálise na cidade de Goiás – Foto: Reprodução/TV Anhanguera