Pesquisa revela que em 62% do território municipal, o Cerrado nativo não existe mais. Nova Fogaréu conversou ambientalista sobre as causas, consequências e soluções para problemática
Foto: Neste cenário de devastação, estudiosos acreditam que existe o risco de que algumas espécies nativas desapareçam. Foto: Fernando Arkanjo
Nestes dias de calor intenso, muita gente parou para pensar nos fatores que favorecem as mudanças climáticas e ambientais que afetam a vida de pessoas ao redor do mundo. A Cidade de Goiás não está imune a estes efeitos e, no último mês, foi uma das cidades mais afetadas com a onda de calor.
E em relação à questão ambiental no município, é vital abordar como a devastação do cerrado vem alcançando níveis preocupantes. Uma pesquisa realizada pelo Águas do Cerrado, grupo de Pesquisa e Extensão, vinculado ao Núcleo de Agroecologia da UEG, cujos estudos estão ligados ao contexto microrregional da bacia do Rio Vermelho, revelou que o Cerrado nativo não existe mais em 62% do território municipal.
“O nível de desmatamento existente nos autoriza a afirmar que no município de Goiás há apenas fragmentos isolados de Cerrado. A manutenção deste isolamento tende a um gradual empobrecimento genético das espécies que podem, se nada for feito, entrar em rota de extinção”, argumenta o coordenador do Grupo Águas do Cerrado, Robson Moraes, que também é professor de Geografia da UEG – Universidade Estadual de Goiás.
A forma com que se tem tratado o cerrado altera ainda os regimes de chuvas na região. Robson explica que as chuvas tendem a ser cada vez mais fortes e com maior risco de inundações.
“A baixa capacidade de permeabilização da superfície, em função da abundância de rochas cristalinas de pouca porosidade, pode aumentar o volume de escoamento de água na superfície. Isso, combinado à ausência de redes de drenagem, forma patente a possibilidade de inundações”, analisa.
Por outro lado, nesse cenário, a quantidade de dias chuvosos diminui e pode aumentar o período da estiagem. “Cidade de Goiás pode ficar entre a seca e as enchentes”, conclui.
Crise hídrica
Segundo o pesquisador, a devastação ambiental impacta também na crise hídrica na cidade e no campo. Um dos exemplos mais claros dessa redução é o do Rio Bacalhau, que ostentava água o ano inteiro até pouco tempo, mas, nos últimos anos,
“Na redução da disponibilidade das águas na superfície há, atualmente, um expressivo aumento do uso de águas subterrâneas, sem o devido licenciamento ambiental e sem os estudos técnicos necessários para utilização”, diz o professor, ressaltando que tal prática pode colocar o município em um ponto sem retorno em relação à disponibilidade hídrica.
Respeitar à legislação e proteger áreas sensíveis são soluções
Entre as causas que colaboram para o desaparecimento do cerrado, o professor Robson Moraes aponta como principal a produção bovina. Segundo ele, o município possui, aproximadamente, uma população de 24 mil habitantes e tem um plantel de quase 300 mil cabeças de gado.
“A produção tem baixa inserção tecnológica. Apresentando rápido esgotamento de solos e demandando formar novos pastos e, assim, avança para a mata nativa”, diz.
A solução para mudar este cenário, segundo o professor, é o respeito à legislação ambiental, além de ser efetivada uma política pública que promova um macrozoneamento ecológico e identifique e proteja as áreas ambientalmente mais sensíveis.
“É preciso elaborar programas de manejo sustentável de pastagens para retirar a pressão da bovinocultura sobre a vegetação. Se faz necessário um emergencial programa de recuperação de áreas degradadas”, aponta, ressaltando que se deve promover políticas e ações de adaptação climática condizente com a preocupação mundial.