A Cidade de Goiás tem uma rica história com seu Carnaval, realizando festas memoráveis há mais de um século, mantendo a tradição, beleza e magia em um espetáculo de samba e cores.
VÂNIO LIMIRO
O Carnaval é uma das festas mais tradicionais e vibrantes do Brasil, conhecido por suas cores vibrantes, ritmos envolventes e celebrações efusivas. Ao longo dos anos, o Carnaval passou por diversas transformações, e é interessante explorar as memórias e tradições que marcaram essa festividade em tempos passados.
O Carnaval brasileiro tem suas raízes nos festejos populares europeus, mas foi no Brasil que a festa ganhou contornos próprios. No início do século XX, já era celebrado com grande entusiasmo, com destaque para as festas de rua e os famosos bailes de máscaras. As pessoas se vestiam com fantasias luxuosas, e as ruas eram tomadas por blocos carnavalescos e corsos.
Ao longo das décadas, o Carnaval passou por diversas transformações. As marchinhas deram lugar ao samba-enredo, os bailes de gala perderam espaço para os blocos de rua, e as fantasias tornaram-se mais descontraídas. As mudanças refletem não apenas a evolução cultural, mas também a democratização e popularização do Carnaval, tornando-o mais acessível a todas as camadas da sociedade.
A importância histórica e cultural do Carnaval na Cidade de Goiás é um dos elementos que integram o patrimônio imaterial da cidade, até mesmo por ser uma tradição secular oriunda dos tempos quando ainda era Vila Boa de Goyaz e que veio a se fortalecer na sociedade formada no período da velha República entre 1900 e 1930.
A partir daí, o Carnaval escreveu sua história pelas velhas ruas da cidade, enfeitando-a com a beleza e a magia dos blocos e o brilho da festa.
Um dos fatos mais antigos que se tem notícia revela que o primeiro bloco de carnaval surgiu da animação de integrantes da União Atlética Goyana, um time de futebol criado por José Elias Pinheiro, que seria um dos pioneiros do Carnaval na cidade.
No início dos anos 20, na véspera do Carnaval, os jogadores do time, liderados por José Elias, após uma partida, resolveram sair em bloco pelas ruas da cidade cantando e dançando. No ano seguinte repetiram a façanha e não pararam mais, era a transformação da União Atlética Goyana no Bloco Carnavalesco União Goyana.
Segundo conta a filha de José Elias, Maria Helena Pinheiro, em um documentário sobre a instituição, em 1973 o Bloco União Goyana foi transformado por seu fundador na Escola de Samba União Goyana
O bloco manteve suas tradições e foi crescendo a cada ano. Fez tanto sucesso ao logo dos anos que, em 1973, José Elias iria transformar o bloco carnavalesco na Escola de Samba União, mantendo viva a tradição da festa de Momo na cidade.
Hoje à frente da escola, o mestre de bateria Jorge Luiz, neto de José Elias, mantem vivo o legado do avô e conta orgulhoso que o registro dos documentos da União foi feito em cartório em 1924. Neste carnaval, quando colocar seu bloco na rua, a União completará 100 anos de folia. Não é pouca coisa.
Ao longo do tempo o Carnaval da Cidade de Goiás cresceu ainda mais, com o surgimento de outros blocos de fantasia, como os que foram criados por Edilberto Santana, um artista que montava coreografias para a entrada dos blocos nos bailes carnavalescos e compôs músicas carnavalescas como “Samba da vida”, “Você me fez chorar”, “É danado de bão”, entre outras conhecidas da época. Logo depois surgiriam as novas criações de Dona Maria Angélica, a Nhanhá do Couto. Animada Dona Nhanhá, que contagiava a todos com sua alegria.
Tempos depois, seria fundado na cidade o clube carnavalesco “O Democrata”, em seguida seria criado o “Caravana Smart”, um grupo de mulheres que angariava dinheiro durante o ano todo para o Carnaval.
Segundo conta o Jornal Vilaboense, numa reportagem publicada em fevereiro de 1994, depois de dias de preparo, finalmente todos se achavam prontos para as batalhas de confete, serpentina e lança-perfume. A Cidade movimentava-se para assistir ao desfile de ricos carros alegóricos, esbanjando beleza e cores. À noite era o momento da apresentação das fantasias.
Desde a década de 20, percebia-se a grande animação do Carnaval de Goiás com o maestro e compositor João Ribeiro, que nessa época lançou as marchas carnavalescas Veneno, Bola Vermelha, No Carnaval, Meu Ciúme, Sei lá se é, entre outras que contribuíram para a festa na cidade. Ribeiro era convidado a escrever marchinhas para quase todos os blocos de carnaval da cidade.
Segundo o colunista Ignácio Xavier da Silva, conhecido como lamerô, e que escrevia uma coluna carnavalesca, os blocos iam surgindo em profusão, e a cada ano a festa crescia. Iamerô cita como destaques os blocos “Os Divorciados do Mar”, “Sei lá se é”, “Não me aperte”, “Enamorados do Rei” entre outros. Nesses blocos, figuras ilustres da cidade se misturavam à gente simples e humilde, dando o tom da festa.
Um dos grandes nomes do Carnaval da Cidades de Goiás foi a artista Goiandira do Couto, que que durante anos organizou, enfeitou salões, criou blocos, participou e ganhou prêmios de Rainha do Carnaval. Goiandira e Nice Monteiro Daher eram entusiastas da festa e cada uma possuía seu bloco. A pintora tinha o Bloco da Banda de Lá, que saia do outro lado do Rio Vermelho; a escritora comandava o Bloco da Banda de Cá, que saia do outro lado da cidade.
Autêntica carnavalesca, Goiandira comandava blocos que saíam às ruas com composições exclusivas. A partir dos seus relatos descobrem-se detalhes especiais da festa de Momo na cidade.
“A corte era composta pelo rei Momo, pelo bobo da corte e um relator. Eles desfilavam na época em carro de tração animal e, ao chegar na praça, subiam até a sacada do edifício onde funcionava a rádio local e então, de frente para a praça, era feita a cerimônia de abertura do Carnaval. O ato era realizado de modo sátiro, com muita animação e com a presença de muita gente que acompanhava o cortejo. Nesse tempo, a escolha da rainha era feita nos bailes de salão e era anunciada a eleita no último dia de festa”, diz o relato de Goiandira.
Grandes personagens fizeram parte desta tradição ao logo da história, entre elas se destacaram pioneiros como José Elias Pinheiro, Goiandira do Couto, Nice Monteiro Daher, Belkis Spencieri, maestro João Ribeiro, maestro João Teles, Iamerô, Catarina de Sena, Noquinha Velasco e Olga Saddi e Rossana Jardim, Oyama Bailão, Regina Lacerda, Madalena Pinheiro, Marlene Veiga, José Saddi, Luiz Henrique da Veiga Jardim, dentre muitos que contribuíram para a história do Carnaval na Cidade de Goiás.
É preciso destacar, sempre, a importância do Carnaval como uma manifestação cultural de grande importância para a história da Cidade de Goiás.
A festa, seus personagens, sua música, a beleza e o brilho das evoluções pelas ruas de pedra da cidade evocam a tradição centenária de um povo alegre e cheio de disposição para a festa.
O Carnaval vilaboense retrata esta tradição festiva; afinal, o fato de Goiás ser considerado celeiro da música sertaneja não quer dizer que por aqui também não vagueie uma alma sambista. E há bastante tempo.
Fotos: Acervo Cida Coutinho, Antônio Campos, Marco Antônio Veiga, Família Saddi